quinta-feira, 15 de outubro de 2020

CONHECIMENTO NÃO PARA CRIAR MAIS DISTRAÇÕES, MAS PARA LIBERTAR

 


Quando o conhecimento era apresentado na forma de diálogos era possível evidenciar o seu caráter transitório com bem mais leveza e eficácia, porque eram várias mentes diferentes contribuindo envoltos com aquela temática. De uns tempos pra cá com os tratados (ou outros nomes que se dão aos textos), tendo-se poucas excessões, isso ficou difícil de se alcançar, já que é dito que o sujeito é unidade. Nesse sentido, ao se lê Galileu, Bruno e muitos outros pensadores de destacadas épocas da travessia humana, se pode perceber como eles estão chamando a atenção em seus diálogos para a seguinte problemática: o conhecimento por vezes pode piorar mais a situação do que melhorar. Essa sutileza na apresentação do conhecimento os tratados não comportam tanto, porque no coletivo o riso é mais possível, afinal ri sozinho não é lá algo muito bem visto nos dias de hoje, não é mesmo rs? 


"Como assim ?", dirá o leitor. "O conhecimento é sempre libertador! Você está sendo contra o conhecimento?" O conhecimento construído por meio de argumento e encadeamento de sentenças (veja bem os termos) é libertador quando ele busca a libertação, mas por vezes a argumentação ou o procedimento lógico do discurso pode não visar isso e, portanto, criar mais obscurecimento e estreitamento do que esclarecer. Isso porque, o conhecimento exposto com base em argumentos depende de para que sentido se está sinalizando com aqueles argumentos. Estar atento a isso é muito mais importante do que o conhecimento que se está visando com aquilo.  


Por exemplo, se eu foco minha argumentação no fogo ou na ação de evitar que o fogo aconteça, qualquer coisa que venha a evitar a criação de chamas parece ser algo benéfico e salutar dentro desse contexto argumentativo. Mas, isso é um estreitamento, é algo muito restrito, enganoso. Um contexto mais amplo será perguntar porquê se deve evitar o fogo. Se deve evitar o fogo na floresta porque ao fazer isso se possibilita a existência da biodiversidade. Assim, evitar o fogo não é o ponto importante, mas o desenvolvimento da biodiversidade é que o é. Porque se eu evito o fogo, mas com isso impossibilito o desenvolvimento da biodiversidade não há ganho nesse sentido. É algo como pavimentar a amazônia para evitar o fogo, que ganho teria isso no que se refere à riqueza daquele ecossistema?


Tampouco há libertação quando se direciona o pensar humano com vistas ao desenvolvimento produtivo de bens de consumo materiais, por exemplo. Não há como aplacar os desejos humanos por bens materiais e por produção. Sempre existirá mais produção e busca por mais produção. Somos muito parecidos com os sapos - se algo se mexe o sapo "glupf" - apesar de também sermos muito diferentes deles. Se algo chama a nossa atenção lá vamos nós, a menos que contemplemos a situação e percebamos aquele condicionamento. Mesmo dividindo essa produção - e o interessante é que isso aconteça - sempre existirá uma insatisfação. Nem os Rolling Stones resolverão isso (rs). Como diria um pensador antigo, para que construir prédios e edificações outras com vistas à contemplação se eu já tenho os jardins?


Assim, é sempre bom lembrar, que, quando Newton propôs suas ideias, por exemplo - hoje os estudiosos mostram que muita coisa não foi ele que pensou primeiro, sendo que a lei da inércia, por exemplo, já havia sido proposta do Descartes, mas isso é outra temática -, sua intenção não era saber quanto de força se tinha que aplicar para levantar um balde de argamassa até o topo de um prédio em construção, problema recorrente nos livros didáticos da atualidade, como também muito semelhante àqueles que constam em exames como o ENEM. Se o ensino atual não tem interesse que se estudem os originais dos pensadores é porque os interesses do nosso tempo estão voltados mais para construir prédios do que para cultivar qualidades mais libertárias e sublimes que dizem mais respeito à contemplação do que à distração, ao mercado e à aparência.

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