segunda-feira, 8 de agosto de 2011

PRA QUE SERVE A ARTE (REFLEXÕES ACERCA DE COMENTÁRIOS SOBRE EDSON DE PIPIU E SUA BATALHA: A QUADRILHA JUNINA JUVENTUDE NORDESTINA)?


Tempos estranhos esses. Tanto nas festividades do São João como agora recentemente, quando estive em Olho D’água, ouvi de várias pessoas algumas frases que me chamaram a atenção. Em resumo, diziam: “O que Edson de Pipiu ganha com essa trabalheira, com essa quadrilha?” Parece que tudo nessa vida atualmente tem que ter significado no sentido da quantificação ou do lucro. As festas e as manifestações artísticas genuínas existem para reverenciar o divino que está em cada um de nós. Inconscientemente, era para isso que personalidades já falecidas como Antônio Ferreira, meu Avô Sebastião de Lídia e muitos outros que não tenho conhecimento ou não lembro agora, faziam bailes em suas residências. Para que se dançasse, conversasse, tomasse alguns aperitivos e liberasse aquele nosso instinto de tribo, dançando samba, chote, baião, rancheira, valsa e xaxado a noite inteira. O ganho que recebiam não pode e não deve ser quantificado em moeda ou lucro de outra natureza.
Nesses instantes em que estamos acometidos pela arte e pela diversão, se abre a clareira que nos conecta ao eterno, lembrando o que me falou um dia o caro amigo Pablo Capistrano. Naquele instante não há o inicio nem o fim, apenas aquela vibração que nos toma por completo, um certo estado de transe, em um grau muito menor, mas semelhante ao que experimentam os místicos e os santos. A realidade nos aparece de forma límpida, se cristalizando em verdade. É de uma noção de verdade semelhante a essa que Cristo estava falando quando dizia: “A verdade vos libertará”.
Quando vi Edson entrar em cena empunhando aquele estandarte da Quadrilha Juventude Nordestina, na festa de São João deste ano em Olho D’água, a emoção me invadiu, me tomou de assalto, não esperava algo tão forte. Vi ali naquela apresentação os sinais dos grandes menestréis, dos mestres de reisado, dos maracatus e dos papangus (manifestação ritualística e teatral muito comum no século passado no sertão nordestino, inclusive nas localidades de Olho D’água – que, diga-se de passagem é lembrada com extremo saudosismo e saudade por muitos daqueles que vivenciaram esta manifestação).
Edson faz parte do clã dos Glória (acho que deve ser este o nome, pois sou mais acostumado a ouvir “Gulora”), família com forte tendência para as artes, principalmente a música, família de sanfoneiros, sendo Pipiu um dos últimos representantes. Querendo ou não, ou melhor, tendo ou não consciência, este filho de Pipiu vem se descobrindo atualmente como mensageiro e fruto desta árvore genealógica, assim como eu recentemente me descobri poeta e perpetuador dos Lopes (que inclusive são abundantes aqui no Seridó, e com as mesmas características dos daí: poetas, cantadores e visionários de alta sensibilidade).
O poeta, sendo um representante da catarse humana que é a arte, é justamente aquele ser que se comunica com as questões mais recônditas e importantes do nosso arcabouço existencial. Seu papel não é administrar a realidade, mas edificar a ponte entre o ente (a nossa carapaça externa) e o ser (aquilo que temos de mais essencial). Sua tarefa é estimular a centelha de nossa chama interior, fazer iniciar o trote das carruagens abandonadas que é o nosso mesmo de cada dia. Estes dias, na vaquejada do Parque Júlia de Freitas, conversa com o poeta e amigo Elói sobre isso, inclusive.
Enfim, acho que Edson desenvolve um trabalho de extrema importância em Olho D’água a frente da quadrilha Juventude Nordestina, fazendo com que os jovens que se reúnem para aquela manifestação desenvolvam suas potencialidades artísticas e corporais. E nesse sentido, acho que os seus integrantes devem fazer valer a sua autonomia, não caindo em cantos de sereia, que querem sim é usar o potencial artístico da quadrilha para seus interesses pessoais. Parabéns Edson e parabéns a todos que fazem a quadrilha!!!
E tratando de forma mais direta a questão que dá título a esses balbucios de um poeta no Domingo à tarde - embora cada linha seja uma tentativa de lançar luz sobre tal questão -, diria como o poeta maranhense Ferreira Gullar, que a vida nem sempre tem muito sentido. Por isso existe a arte. Encerro com uma poesia de minha autoria:

Textos dentro de garrafas
A trafegar em água calma
No curso da correnteza
Por entre os becos da alma

Assim é a poesia
E seu oficio profundo
Fazer a gente sentir
O vivo pulsar do mundo

O ofício do poeta
É ver em tudo magia
Diluindo assim a morte
Em pingos de poesia.

Ritualizemos sempre.
Prof. Adaécio Lopes

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