quinta-feira, 29 de setembro de 2011

Que título dar a um poema?

Vão por entre os rios

Dos vales das sombras

Lá onde as coisas

Ganham seus nomes

Alimentem outros córregos

De mentes ruidosas

De águas barrrentas

E pingos nervosos

A minha saudade,

A minha esperança?

Traquejo com elas

Em passos de dança...


Adaécio Lopes

29/09/11
16:07

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

Mãos à obra

Meus amigos viver neste mundo moderno não é fácil. Assumimos que somos responsáveis por nós mesmos e por tudo, mas essa equação nunca bate. Estamos sempre com uma sensação de vazio, de perda e de incompletude que de forma alguma é resolvida a golpes de crítica, e muito menos se desconsiderarmos a critica e nos fecharmos no nosso mundinho egóico. Mas então qual a solução? Esse é justamente o problema: acharmos que tem uma solução para as coisas. Então é deixar tudo como está e pronto, ser um ente passivo e não buscar nenhum aperfeiçoamento? Não se trata disso, a questão é que, como colocou o pensador Ludwig Wittgenstein - mas não apenas ele, muitos sábios chegaram a este entendimento por outras vias – se há uma pergunta, é porque haverá uma resposta. Ou seja, a resposta já nasce com a pergunta. O intento já mostra suas garras justamente ao se constituir como intento. Ou ainda, a vontade não se livrará da vontade com um golpe de vontade. Como dizia sabiamente Raul Seixas, o princípio e o fim estão eternamente unidos em um romance astral.
E nesse sentido, a política, pelo menos como é feita atualmente, nada tem a nos ajudar. Isso porque esta política, sendo tributária do pensamento moderno, acredita que nós existimos como algo isolado, como um ser em separado e temos autonomia sobre nós mesmos. Veja, não estou me referindo a esta noção habitual de autonomia (financeira, profissional, social etc.). O que estou querendo dizer é que, assim como todos os saberes antigos sinalizavam, nós e o mundo não somos entidades separadas, mas um uno indistinto. No mundo moderno, ao contrario, nós não vivemos o mundo, carregamo-lo nas costas. E essa tarefa está cada vez mais complicada de ser efetivada. O fato é que, meu amigo, eu sinto em informar, mas você não existe, não como sempre tem acreditado. Você, João, Severino, Paulo, Francisco, Antônio, não existe. Esse nome, essa identidade, essa noção de propriedade privada que todos nós temos, tudo isso é recente. É moderno. Como diz o pensador Michel Foucault, o homem como conhecemos é algo muito recente na história da humanidade. E segundo este pensador e outros, tal conceito já tem seus dias contados.
Um exemplo da personificação da existência humana é representada pelo seguinte: os nomes, pelo menos os tradicionais, se referem sempre a alguma situação, paisagem, sentimento, característica e etc.. Ou seja, o nome João não é João por causa de João, mas pelo que significa a palavra João, digamos. Embora hoje a gente tenha perdido esse significado. Pedro, por exemplo, quer dizer pedra, rocha, o que remete a uma idéia de força, resistência, potencia. Os nomes dos sítios ainda são exemplo do momento anterior, já que as cidades vão a cada dia ganhando nomes de pessoas, entrando no mundo do culto á personalidade, compactuando da idéia de que o homem existe como algo separado do todo. Imperatriz, Varzea da Caatinga, Junco, se transformaram em Matins, Rafael Godeiro, e Messias Targino, só para citar alguns exemplos da região circunvizinha a Olho D’água do Borges (que nome lindo e poético esse de nossa cidade).
Achar que nós existimos causa todo tipo de mazela para os humanos. Os animais, por exemplo, não possuem esse problema. Não se angustiam com a morte, não precisam justificar sua vida a todo instante, nem eleger outros animais para governá-los com medo de que não o consigam. Ainda achamos que somos muito melhores do que os animais! Esse humanos... Se tratando do mundo cristão – já que praticamente todas as culturas possuem exemplos semelhantes - Jesus nos falou justamente dessa problemática: aqueles que querem me seguir larguem tudo. Entendo que Jesus não queria ser seguido, como o termo faz entender, queria sim ser entendido, assimilado como mensageiro do além homem. Hoje se sabe que o Cristo era estudioso e praticante dos saberes dos Essênios, tribo nômade, que praticava a partilha, a comunidade e o desapego. Essas concepções permeiam a figura de Jesus, como sabemos. O que significa largar tudo e segui-lo? Significa ir além dessa carapaça que achamos ser o todo. Ir além do nome, da propriedade, da mente. Realmente ser! Lembra quando Jesus foi perguntado se era o Rei dos Judeus? Qual foi sua resposta? “Tú o dizes”. Algo semelhante ao que Buda respondeu quando perguntado se tinha atingido a iluminação.
Voltando à política, dá para perceber que não se trata de ser um ou outro candidato ou governante que resolverá essa situação. Ninguém a resolverá, e nesse sentido, muito menos a política. Isso porque, ela caminha no sentido de centralização no homem, no ego e no poder que isso enseja. Então como seria um governo dentro desse contexto de “negação” do homem? Veja, se a pessoa entende que ela não existe como um circulo autosuficiente, se entende, ainda como Raul Seixas, que somos uma metamorfose ambulante, que “hoje eu sou uma estrelaa,manhã se apagou”, que “se hoje eu te odeio e amanhã lhe tenho amor ... que eu sou um ator”, nada mais natural do que caminhar no sentido de uma descentralização. A única coisa que a centralização gera é poder, e o poder não tem outra ação que o caracteriza, o poder é feito para subjugar. Então o que fazer com esse poder que você centraliza em você mesmo, para que não colapse? Voltá-lo contra os demais. Quem acredita mais na política? Ela existe para seu interesse próprio. Todos nós sabemos disso é só olhar de lado e/ou pararmos para pensar um pouco.
Logo, a atitude realmente séria de quem quer se meter com política deve ser: estar nela o mínimo possível. Nesse sentido, descentralizando as ações, as decisões, os benefícios. É nesse sentido que criticamos a atual gestão em Olho D’água do Borges. Veja, isso não é eu que estou dizendo. As denuncias são praticamente diárias e de muitas pessoas, e sobre várias áreas e situações. Mas algo permeia e é comum a todas elas. A prepotência, a intransigência, a centralização e o falta de abertura que existe nesse governo. Como já foi colocado, por várias pessoas inclusive, como é que um governo pode dizer que há cidadania com uma postura dessas? É o que se costuma dizer: é dar um tiro no próprio pé. Todos percebem. Está em tudo o caráter centralizador desta administração, os próprios aliados confirmam, assumem. Talvez colapse internamente, como alguns indícios recentes demonstram, para os mais observadores.

Deixemos a poesia falar:

A OBRA

A obra é o rastro
A relva e o pasto
Pegadas vencidas
Êxtase gasto

Não tem serventia
Na hora do dia
Que nos incendeia
Aquela agonia

Em torno da gente
O que ela constrói
É apenas semente
De espinho que dói

Joga-nos no tempo
E nos apavora
Sendo assombração
Para toda hora

Lembra-nos da gente
Força-nos à guerra
Faz-nos indivíduos
Á face da Terra

Liberte-se disso
Fale de outro jeito
Rompa o universo
De causa e efeito

Você não existe
Já sabe que não
Portanto, não junte
Pegadas do chão

Será que há jeito?
Ser um ente contente?
Sem pensar direto,
Que está indo em frente?

Será o progresso,
Um irmão do medo?
Gritando pra gente,
Que já não é cedo?

Se não fosse assim,
Como é que seria?
E o resto de tempo,
Desse fim de dia?

Autor: Fragmentos de Sendo na Solidão da Tarde ou Aquele a Quem Chamam Francisco Adaécio Dias Lopes

terça-feira, 20 de setembro de 2011

Eu, meu pai e a estrada

Meu pai grande e eu pequeno
Na estrada do cacimbão
Alguém nos acompanhava
E fazia uma saudação
E entabulavam conversa
De alguma situação

Esse era meu cinema
Passadiço dos Joéis
Eu, papai e Lourival
Representando os papéis
Tinha Anísio e Chico Barros
E outros grandes menestréis

Papai sempre caminhando
Fazendo o sinal sagrado
Uma ferramenta na mão
E um cachorro de lado
Ouvindo o som da cigarra
Este ser vivo encantado

O vivente andando a pé
É que contempla o sertão
Esse era o conselho
Do ilustre Gonzagão
No devagar das passadas
E no ritmo do Cancão

À noitinha os vaga-lumes
Em sua dança altaneira
Junto da farra dos pássaros
E o baile da Rosa–cera
Mostravam ao sertanejo
A vida da Terra inteira

E na subida do alto
Avistava-se a cidade
Papai olhava pra traz
A contemplar a verdade
E aquela ação já era
O reflexo da saudade.


Adaécio Lopes

Olho d'Água do Borges - Alguns sítios da localidade

Olho D’água e as mangueiras
Inveja e seus campos vastos
Bela vista é a paisagem
De lindos, floridos pastos
A cacimba da fazenda
Com aqueles tijolos gastos

Bela-flor é alagado
O Alívio é a quietude
Sítio Brejo já nos lembra
Aquele grande açude
Nos Cardosos têm as festas
Que animam a juventude

Lembro da Várzea Comprida
Que até parece uma ilha
Da figura de Raimundo
E daquela sua filha
Do parente João de Lídia
E sua gorda matilha

Grotão de Euclides Sales
De conhecida fartura
Aqueles grandes currais
São exemplo da estrutura
Do maravilhoso mundo
Desta forte criatura

Lá no sítio Timbaúba
Impressiona-me aquilo
É um castelo, é um mundo
De exuberante estilo!
Paro e fico contemplando...
A casa de Petronilo.

Riacho do Cunha e Tanques
Torão, Serrote e Nevoeiro
Gitirana e Cajazeira
Caiçara e Tabuleiro
Borracha e São Geraldo
E Encantado verdadeiro

Lagoa Grande é um mundo
O sitio de outros viventes
Os arvoredos e os ninhos
Veem sempre com as enchentes
Pitando um quadro frondoso
No húmus de nossas mentes

Adaécio Lopes

terça-feira, 13 de setembro de 2011

Conhecimento

Atmosfera de conceitos.
Bases em erupção
Sopram vapores etéreos
Que se converte em ação
Todo dia e a cada instante
Uma nova invenção


Em cada vulcão um mundo
Em cada unidade um ser
A busca pela resposta,
Que servirá pra manter
O encadeamento de tudo
Que hoje se pode ver.


Que destino trágico esse!
De um ser ao alvorecer
Rebelar-se contra um plano
Que vive do seu viver,
Como sair desse impasse,
E atingir todo o Ser?


Adaécio Lopes

A sociedade fantasiada de loucura

O amigo Hugo Freitas, futuro enfermeiro, após cursar a disciplina de Saúde Mental, produziu este texto que divulgo com vocês. Ele também está se aventurando na escrita, está aos poucos entrando na toca do coelho.


Durante muito tempo as pessoas que apresentavam algum transtorno mental eram consideradas como seres endiabrados, ou ainda malucos e ponto final. A terapia do choque elétrico era a maior tecnologia disponível por muito tempo, e acreditava-se que aquelas sessões serviam como estabilizadores das mentes, os chamados “choques dos milagres” mal sabiam eles que o que ocorriam eram uma decapitação maior do que se tinha anteriormente, os doentes mentais eram molestados e castrados mentalmente, era a época da “morte viva”, era um tempo em que as ciências médicas procuravam didáticas mais coerentes para o tratamento de tais pessoas, no entanto o que se via eram hospitais psiquiátricos cada dia mais cheios e com uma mística de que, o choque combinado com a hospitalização íntegra e forçada causava uma tranqüilidade maior ao paciente. Este arcabouço de agressões causou além de melancolias e destruição neural, uma série de internamentos errados (o filme bicho de sete cabeças mostra exatamente isso), drogados ou pessoas que usavam drogas eram confundidos com loucos e misturados e obrigados a compartilharem da terapia elétrica.

Contudo o que se viu foram pessoas que nem saiam de uma esfera de dependência química, e ainda por cima acrescentavam os números de uma estatística assombrosa de loucos e de pessoas rejeitadas pela classe social dita como normal.

O que discutimos hoje em dia quanto humanos é entre outras coisas a inteligência do homem e, seus grandes nomes. Sigmun Freud foi apontado por muitos estudiosos e historiadores de sua arte, como sendo apenas mais um a desfrutar do prazer que os entorpecentes causavam no seu paladar cerebral. Então baseado neste contexto percebemos que se ele não fosse o Freud certamente este seria um maluco que necessitava de hospitalização logo, pois o que se via era não uma pessoa que queria um baseado ou uma carreirinha de pó, más um cara que dependia e necessitava de atendimento psíquico disponível.

O estudo da Saúde Mental envolve o homem como um todo, considerando as esferas biológicas, psíquica, social e espiritual. Abrangendo assim, desde o contexto social em que está inserido, até a fase de desenvolvimento em que se encontra. E é nesse processo que a saúde mental tem a necessidade de ser entendida de modo a considerar os constantes acontecimentos e mudanças no modo de pensar e atender a pessoa portadora de transtorno mental. Avanços na neurociência e na medicina do comportamento mostraram que como muitas doenças físicas, os transtornos mentais e de comportamento resultam de uma complexa interação de fatores biológicos, psicológicos e sociais. Entretanto, essas três dimensões biopsicossociais mantiveram-se separadas por muito tempo, criando visões fragmentadas e gerando práticas e saberes desarticulados.

DEPOIS DESTE CONTEXTO HISTÓRICO QUESTIONAMOS;

O que se percebe hoje em dia é que os “doidos” de fato conseguiram um espaço considerável nas rodas sociais, porém ainda há um longo caminho a percorrer.

As novas campanhas em saúde mental apontam para uma tônica de que a reinserção social, com o auxílio de profissionais capacitados e o apoio da família podem proporcionar a estes uma vida bem próxima do normal. Neste momento surge mais um questionamento: e somos normais? Não somos loucos? O que de fato é ser normal? Será que o fato de não se deitar no chão (como Neizão faz), ou não dizer coisas sem nexo (como Geraldo doido faz), é nos auto classificar normais?

Quando chamamos uma pessoa de maluco nos transformamos em médicos psiquiatras, uma vez que fazemos verdadeiros diagnósticos, dizemos que ele tem psicoses, neuroses e comportamentos diferentes. De fato isso é um pensamento perigoso, pensar como os outros não nos faz bem, isso nos leva a um mundo lapidado por outras cabeças, e talvez isso seja o ponto forte dos doentes mentais, “ELES FAZEM O QUE LHES DÃO NA TELHA”.

Quem foi que disse que dançar discrepantemente, ou ainda gritar por uma grande emoção é comportamento de loucura? Acredito que uma das maiores fraquezas mentais desta sociedade é pensar que existe um caminho único para a vida de todos. Às vezes o que pensamos sobre um fato pode ser apenas um pensar, más a certeza é que as atitudes são acima de tudo a foice que abre o caminho para suas verdadeiras vidas. Quem não chamaria Zé Ramalho de louco quando este abandonou uma faculdade de medicina para ser cantor de botequim? E hoje em dia será que as mesmas pessoas o chamariam?

Portanto, acredito que as novas tendências impostas por esta sociedade e a maioria das pessoas, são sem sombra de dúvida um fator grave de riso para a verdadeira loucura da vida que é parar suas vontades e não acreditar naquilo que você quer e pode alcançar. Ser assim pode sucumbir suas expectativas de vida e transformá-lo para sempre, então desamarre-se, erga a cabeça, vista-se com aquela calça djeans rasgada que a sociedade descrimina más que você gosta tanto e, seja feliz enquanto você tem saúde.

Finalizo com a célebre mensagem: “O QUE MAIS ME SURPREENDE NA HUMANIDADE SÃO OS HOMENS QUE ACHAM QUE TEM SAÚDE. MAL SABEM ELES QUE TER SAÚDE, NÃO É APENAS APRESENTAR SINAIS E SINTOMAS. TER SAÚDE NÃO É SÓ AUSÊNCIA DE DOENÇAS. MÁS ACIMA DE TUDO PERCEBER UM COMPLETO BEM-ESTAR FÍSICO E MENTAL, ASSIM SENDO, É NECESSÁRIO QUE SAIBAMOS USAR A MELHOR COISA QUE TEMOS: NOSSAS VIDAS”.

Valeu irmãos!
Ritualizemos sempre.


HUGO FREITAS. 10/ 09/ 2011

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Caminhando

Escrever é exorcizar fantasmas. Ou melhor, dialogar com eles. De repente, uma idéia, uma problemática se apossa da gente e a melhor forma de se libertar desse encosto é enfrentá-lo. O que me motivou a escrever estas linhas não foi algo muito novo, nem o que vou falar o é, inclusive. Talvez a novidade seja a descrição de algumas nuances acerca desta problemática.

A questão é antiga e batida: na nossa pratica pedagógica, devemos ser conservadores ou construtivistas? Treinar ou fazer desabrochar inquietações?

Várias são as nuances que comungam para que a educação aconteça como adestramento e treinamento. Vejamos algumas delas. Primeiro vem o fato de que é muito mais fácil fazer o que vem sendo feito desde sempre do que propor algo diferente. Associado a isso, ou como parte deste processo vem o fato de que o capitalismo e seu mercado encorajam a necessidade de se preparar os estudantes para este mundo que ai está, para o dito mercado, instituindo aquilo que Paulo Freire chamou de educação bancária, na qual os aprendizes vão à escola, enchem suas gavetas de palavreados, conceitos e expressões e vão trabalhar. Algo totalmente mecânico. Acima de tudo isso, está o fato de que o ser humano está sempre apegado a certa noção de segurança, tentando sempre encontrar o seu paraíso, o cessar dos conflitos, como se isso fosse alcançado tão facilmente, e por um ato de vontade.

Mas, bancando o advogado do diabo, diríamos: até que ponto se tem direito de propor algo diferente para nossos alunos? Que direito nós temos de jogá-los na correnteza (diriam os mais conservadores)? Vejamos, agindo desta forma conservadora estamos nos colocando como deuses, como entes que deteriam a capacidade e a prerrogativa de decidir pelos outros, nesse caso os alunos. E pior ainda, estamos pressupondo com isso que o aluno é em si refratário ao novo, onde na verdade me parece que essa resistência vem sim é de nós mesmos. No fundo, quase sempre, a batalha a travar é contra nós mesmos.

O fato é que somos ainda muito presos àquela concepção de aluno como tabula rasa, como folha em branco que devemos preencher. Inclusive, acerca disso, lembro-me do que me falou o amigo Newton Lucena outro dia, quando de andada pelas ruas de Natal, sobre o fato de a palavra aluno significar “aquele que não tem luz” (a – negação; luno - luminoso). As palavras realmente são nascentes por onde podemos apanhar os signos do mundo. Essa concepção acerca do aprendente, daquele que está em desenvolvimento, fez com que o professor – este termo inclusive remete àquele que professa, que repete, que doutrina, ao invés de educador, que seria algo mais completo - se transformasse em um profissional, apenas, um assimilador e repetidor de teorias, escravizando-nos nessa tarefa hercúlea de lotar a gaveta, o receptáculo, levar luz a um ser supostamente opaco.

Apesar do relativo pouco tempo que convivo como professor com colegas em escolas, pude perceber nos nossos semblantes a insatisfação com a situação em que estamos metidos, muitas vezes por não desenvolvermos completamente nossas reais questões. Não tenhamos medo meus amigos. Saltemos pra dentro de nós mesmos. O que importa não são os portos, mas a travessia. Devemos exercitar a sabedoria e nessa caminhada nada mais natural e generoso de nossa parte do que ajudar aqueles que estão iniciando a sua travessia, assim como outros nos ajudaram. Eis o que seria uma bela metáfora para a figura e a prática do professor, ou melhor, do educador.

Percebo na maioria dos professores, uma componente muito forte ligada à imaginação, ao sonho, à sensibilidade, sendo este o motivo que talvez os fizeram procurar aquela carreira. Mas acontece que as formatações do sistema educacional o levam a se tornar um treinador de jovens e um repetidor de teorias, e isso faz desaparecer o brilho de seus olhos. Não sei se já ouviram falar, mas os pássaros que não apreendem a voar acabam morrendo de tristeza, de melancolia, digamos. Algo semelhante acomete os professores, inclusive sendo talvez responsável por diversos problemas emocionais relacionados a esta classe.

E o econômico, o mercado, o poder de compra, e o dinheiro, estas neuroses modernas, são obstáculos a transcender – podemos até conviver com elas, mas não podemos deixar que sejam representantes absolutos de nossa natureza, de nossos anseios, pois nos impediriam de alcançar as nossas reais verdades. Lembro nesse instante de uma história transmitida a mim pelo amigo Pablo Capistrano. Por coincidência depois pude ter acesso a esta bela narrativa em livros. O que seria de nós sem os amigos? Sem eles como faríamos o ritual diário? Epicuro que estava certo, um homem precisa de poucos e bons amigos, e de uma vida analisada.

A estória se deu na Grécia Antiga, e se passou, salvo pequenas incongruências, como informo a seguir. Alguns estudantes de filosofia, de tanto ouvirem falar do sábio, do grande Heráclito de Éfeso, decidiram conhecê-lo – este pensador é muito conhecido pelo aforismo em que manifesta o caráter fluido e mutável do mundo, da existência, ao declarar que jamais um homem tomará banho num mesmo rio, pois ambos, passados um segundo que seja, seriam diferentes de outrora. Estes jovens cruzaram grandes distâncias e dificuldades até encontrar a casa daquele velho sábio. Encontrando uma humilde residência tiveram a informação de que ali habitava o eminente Heráclito. Ao observarem aquele senhor velho, tentando acender uma fogueira para se esquecer e talvez cozinhar alguma comida, não se contiveram e exclamaram: “este é o grande Heráclito de Éfeso, considerado o oráculo vivo da Grécia?”. Nesse instante ele olhou para os jovens e balbuciou, do alto de sua grande sabedoria: “Os deuses também habitam esta casa”.

Ritualizemos sempre.
Adaécio Lopes.

E ESSE TAL DE CONSTRUTIVISMO, O QUE É? DE ONDE VEM?

Trataremos de algumas questões teóricas relacionadas ao construtivismo. A idéia de construtivismo é tributária, advém do intuitivismo, ou intuicionismo, concepção fruto das discussões mediadas por paradoxos acerca da lógica e da matemática. O principio do intuicionismo surgiu do fato de o matemático Frege tentar reduzir a Matemática à Lógica. Isso porque Frege abstrai como principio, ao declarar que “toda propriedade determina um conjunto”, que a propriedade precede, antecede o conjunto. Russell, outro matemático, com seu paradoxo dos conjuntos que não pertencem a si mesmo, quebra o principio da abstração de Frege. Para Russell, “não é possível construir um conjunto dos conjuntos que não pertencem a si mesmos” (paremos um pouco nesta poética viagem matemática), por exemplo. Trocando em miúdos ele está dizendo que a propriedade é algo que surge da interação com o real, enquanto Frege parece entender que a ideia, a abstração, a teoria é que determinaria o real.

O outro personagem desta história é Brouwer. Segundo ele, Frege estaria equivocado, pois a lógica não é mais fundamental que a matemática, e o paradoxo vem do fato que considerarmos finito por abstração o que é infinito por natureza. Para Brouwer a intuição “é uma faculdade da mente que conhece imediatamente”, logo, “o conteúdo do currículo matemático deveria ser organizado em torno dos elementos, sendo que cada aluno deveria construir, ativamente, a matemática para si mesmo”. Isso porque, ainda segundo ele, “os elementos da matemática emergem concomitantemente com as construções matemáticas e são produzidos pela mesma ação livre da mente humana que produz as próprias construções”.

O intuicionismo considera a matemática como absoluta, enquanto que para o construtivismo esta é falível. Esta é a principal diferença entre construtivismo e intuicionismo. No entanto se não nos prendermos a esse detalhe poderemos considerá-los como pertencentes a uma única problemática. Não discutirei o mérito da questão se a matemática manifesta ou não os vestígios de uma suposta verdade absoluta.

Em minha opinião a principal contribuição do intuicionismo ou do construtivismo, seu descendente, é o fato de considerar a existência como algo aberto a infinitas possibilidades, sinalizando para a liberdade que isso enseja. Nesse sentido, a nossa prática pedagógica deveria estar de acordo com aquela velha máxima socrática, que acredita que o mestre não deve ensinar questões e respostas aos alunos, mas sim ajudar os alunos a desenvolver as suas próprias.

Adaécio Lopes