domingo, 25 de dezembro de 2011

ESCRITOS DE VIDA PARA O RITO DE PASSAGEM

Terreno espinhoso este da blogosfera. Os blogs, que poderiam ser usados para a reflexão, problematização e questionamentos, são cada vez mais utilizados no sentido do culto à personalidade. Coisas da humanidade e desses tempos, marcados pela imagem, pelo efêmero.

Diria que, desde que o mundo é mundo, o homem tenta se libertar de si mesmo. Essa é uma tarefa árdua, mas talvez a questão essencial para todos nós, mesmo para aqueles que não param para pensar nisso. A nossa ação parece ser conduzida por isso. Até mesmo aqueles que se arvoram superiores pela ascensão social que conseguiram, também estão nessa, manifestam este comportamento pelo mesmo impulso, embora este seja um mecanismo ineficaz, tanto para eles mesmos como para os demais integrantes do convívio social, pois o máximo que conseguem com isso é incitar a competição e a idiotice.

Lembro do biólogo Humberto Maturana: a natureza não é competitiva, os animais apenas agem para suas necessidades, mesmo quando matam. Os homens, competidores, não. Estes querem possuir para que os outros não possam possuir. É algo extremamente diferente do mundo dos bichos. A autoprojeção, para aqueles que são afeitos a ela, não é um deleite pessoal, mas social. Lembro do antropólogo Roberto da Mata: para a maioria dos homens, se as conquistas fossem atividades acontecidas na solidão, nada significariam. Ou seja, para esse referencial, o ato de reconhecimento passa a ser mais relevante do que a coisa em si. A casca externa ao invés do conteúdo. Nesse sentido, aquilo que repetem para si mesmos como grandes conquistas não passam de castelos de areia quando bate a dor, pois não possui relevância no íntimo do ser. É algo vazio. E isso não será atenuado através do materialismo, não importa o tamanho do castelo. Embora essa seja a ética destes tempos sombrios.

Quando não entramos, guerreamos com os de fora. E tal guerra não tem fim, logo não terá vencedores!

Discutia isso e mais outras coisas com os estudantes outro dia. E queria deixar claro desde já: essas questões interessam sim e muito àquelas jovens criaturas, que, diga-se de passagem, estão na crista da onda, no olho do furacão. Ou vocês acham que estes viventes não têm preocupações? Nunca se exigiu tanto desta parcela da juventude, em termos de resultados e metas a cumprir. Os seus olhos brilham quando lhes damos oportunidade de falar as suas angustias. Esse é um dos motivos que me fazem acreditar que a forma como está sendo conduzida a discussão sobre as questões (e sobre quais são as questões que devem estar presentes) no meio escolar está totalmente por fora.

Colocava para eles, que, quando nos aprofundamos um pouco que seja na história do mundo, percebemos que as questões que motivaram os grandes pensadores de todos os tempos não foram de ordem econômica ou personalista (no sentido da autoprojeção), mas sim a busca de respostas para as questões essências, como Inicio e Fim, por exemplo.

Qual o sentido de caminhar por essa vereda?

O que sou eu em relação ao todo?

Sou alguma coisa em relação ao todo?

Querendo ou não essas questões estarão conosco sempre. Quanto mais corremos do essencial, mais ele parece aproximar-se da gente de forma arrebatadora, mesmo que não percebamos. E isso nos vem muitas vezes como avalanche. Quanto mais nos distanciamos de nós mesmos, maior será o impacto que teremos que suportar. Não importa quantas fotos bonitas postemos na internet. Não importa quantas informações sejam postadas para florear uma personalidade com a qual nos acostumamos e acreditamos ser o todo que nos constitui. Jamais conseguirão com isso atingir a paz. Apenas a verdade nos libertará. E ela não é dada, é sentida, entendida e escutada por cada um de nós (na verdade nem todos acordarão da Matrix), e a cada instante: é um processo dinâmico. As questões não serão resolvidas pelo discurso, nem pela imagem social e econômica construída, e pelo poder que isso enseja.

Quando não entramos, guerreamos com os de fora!

Lembro-me agora de algo que li estes dias, a carta de recusa feita pelo filósofo Espinosa (1632 - 1677) ao convite para que lecionasse na Universidade de Heidelberg. Naquele documento o pensador expõe os motivos da recusa: dúvida acerca dos limites da liberdade que lhe dariam para estudar os enigmas da existência; e o fato de ter que se ocupar com coisas com as quais não estaria interessado, o que lhe tiraria parte da tranqüilidade da alma.

É preciso entender.

Marcar terreno.

Começar a travessia.

Fugir dos moinhos de vento.

Regressar à montanha.

Sair da caverna.


Mas, parafraseando um buscador que nos deixou em 1994: Eu já falei demais.

Namastê.

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